Tuesday, December 08, 2009

O CRIME DE ESTUPRO E A LEI Nº 12.015/09: UM DEBATE DESENFOCADO

A lei 12.015/09 que alterou substancialmente o capítulo dos Crimes contra a liberdade sexual, sofreu diversas críticas acerca de sua interpretação. A nova lei exclui o art. 214 que trata do atentado violento ao pudor, dando nova redação ao artigo 213, estupro: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”.

Segundo o autor uma das mais importantes polêmicas acerca deste assunto é se o atual artigo 213 trata-se de tipo penal misto alternativo ou cumulativo.

No dispositivo legal a tipificação do delito ocorre de forma ampliada, acrescentando conduta diferente de conjunção carnal à conceituação de estupro. A corrente que nos remete ao tipo misto alternativo está fundamentada com base no entendimento de que, por o artigo especificar diversas condutas diferentes a prática de uma ou de outra por si só caracterizariam um único delito, mesmo que praticadas conjuntamente.

No entanto a interpretação dos adeptos à corrente cumulativa é a de que, já que o dispositivo traz mais de uma conduta, a prática simultânea delas implica em crimes diferentes, concorrendo materialmente para a aplicação da pena.

Para o autor pouco significa essa discussão. Seu entendimento é de que não há tipo penal misto e não existe, neste artigo, mais de uma conduta delituosa. Faz uma análise do artigo resgatando os elementos objetivos do tipo penal, aonde o núcleo da ação é o verbo constranger, que é a conduta esperada do agente deste crime. Esta conduta é diretamente ligada à forma de execução “mediante violência ou grave ameaça” e ao objeto da ação “alguém”, que venha a ter conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso.

A partir desse exame no tipo penal surge a idéia de que o agente do crime não será necessariamente o mesmo a consumar a conjunção carnal ou a prática do ato libidinoso. Nesse caso então passa a existir dois agentes ou sujeitos, o ativo, que é quem irá constranger a vítima, e o sujeito passivo, que será o ‘destinatário’ da conduta.

A vítima então desloca-se de sujeito para objeto da conduta criminosa, passando a ser o objeto material da ação. Essa interpretação se deve à alteração da redação da frase que especifica o crime, pois anteriormente a conduta típica era constranger mulher à conjunção carnal, e segundo o artigo atual é constranger alguém a ter conjunção carnal, indicando que a conjunção carnal pode ser praticada por pessoa diversa do agente.

Salienta o autor que não há diferença quanto ao valor da liberdade sexual masculina em relação à feminina, descartando-se a necessidade de existência de dois tipos penais para esses delitos. Situação que foi remediada pela nova redação do artigo.

Por fim, conclui que surgiu uma nova figura típica, diferente das anteriormente existente, e este é um tipo penal com uma única conduta. Pois descreve o constrangimento para qualquer ato libidinoso, seja a conjunção carnal isoladamente, ou vários atos libidinosos subseqüentes, enquadrando-se então em um único delito punível.


Ficha de leitura do texto de Vinicius de Toledo Piza Peluso

Monday, December 07, 2009

Inquirição de Testemunhas - Nova metodologia.

Com o advento da nova legislação processual penal, no que diz respeito à procedimentos e provas, diversas alterações podem ser observadas na persecução penal.

A lei 11.690/2008 introduziu no Código de Processo Penal uma nova forma de inquirição de testemunhas, reformando a metodologia anterior que caracterizava um procedimento de alta inquisitorialidade, onde cabia ao magistrado a realização do questionamento às testemunhas arroladas. Dessa forma deveriam as partes, acusação e defesa, formular as perguntas ao magistrado, este incubia-se de analisar, interpretar e traduzir as perguntas para as testemunhas, a fim de evitar respostas induzidas ou perguntas que nada tenham a ver com a causa.

No novo procedimento isso não ocorre, uma vez que as partes interrogam diretamente as testemunhas, ficando a cargo do juiz a intervenção caso haja qualquer irregularidade.

Além disso, modificou também a ordem de inquirição de testemunhas e ordem de formularão de questionamentos.

As partes devem formular as perguntas antes do juiz, primeiro a acusação e depois a defesa para que seja preservado o contraditório. No entanto, antes das perguntas, a vítima ou a testemunha pode declarar livremente sobre os fatos.

Após, o magistrado deverá realizar as interrogações ainda pertinentes que não tenham sido observadas, e que julgar necessário para a decisão do feito. Assume, então, o papel de fiscalizador do processo, pois embora a legitimidade para interrogar as testemunhas não seja principalmente dele, o magistrado tem o poder de vetar aquelas perguntas que podem ferir os preceitos do devido processo legal.

Outro ponto que merece destaque é a exigência da presença do acusador e do defensor na audiência, para evitar ofensa às garantias constitucionais.

Na análise do novo procedimento os autores fazem referência à semelhança do sistema processual penal brasileiro com o norte-americano, denominado cross examination, e o italiano, chamado esame incrociato, considerando o interrogatório direto ao acusado, vítima e testemunhas pelas partes, conciliado à possibilidade de o magistrado intervir e formular seus próprios questionamentos ao final.

Embora esteja devidamente prevista em lei, essa nova metodologia oferece certos riscos à segurança jurídica, pois, segundo os autores, não há regulamentação o suficiente acerca dessa matéria, deixando muitos pontos controversos a serem discutidos.

O magistrado, por se tratar de fiscalizador e destinatário da prova, deve se manter alheio aos interrogatórios, pois sua função de indagador é apenas suplementar, para suprir possíveis omissões. Desta forma deve-se respeitar a ordem de inquirição, sendo que a inversão pode acarretar sérios danos ao ato processual.

A formulação de perguntas pelo juiz antes das partes é vício que atinge formalidade essencial, pois fere o devido processo legal, invalidando o depoimento e impedindo a sua utilização no processo. Ou seja, caracteriza nulidade absoluta no âmbito processual.

Portanto qualquer depoimento ou ato eivado de vício jurídico deve ser inutilizado, a fim de se preservar o ato decisório e valorizar a evolução da legislação quando prevê um processo que preserve a constitucionalidade, democracia e o contraditório, que são a base de todo o ordenamento jurídico brasileiro.




Fichamento do Texto de autoria de Nereu José Giacomolli e Cristina Carla di Gesu